Devocionário

Ora et Labora

36º Dia – Quarta-feira da 5a Semana da Quaresma


A ociosidade é inimiga da alma; por isso, em certas horas devem ocupar-se os irmãos com o trabalho manual, e em outras horas com a leitura espiritual. Pela seguinte disposição, cremos poder ordenar os tempos dessas duas ocupações: isto é, que da Páscoa até o dia 14 de setembro, saindo os irmãos pela manhã, trabalhem da primeira hora até cerca da quarta, naquilo que for necessário. Da hora quarta até mais ou menos o princípio da hora sexta, entreguem-se à leitura. Depois da sexta, levantando-se da mesa, repousem em seus leitos com todo o silêncio; se acaso alguém quiser ler, leia para si, de modo que não incomode a outro. Celebre-se a Noa mais cedo, pelo fim da oitava hora, e de novo trabalhem no que for preciso fazer até a tarde. Se, porém, a necessidade do lugar ou a pobreza exigirem que se ocupem, pessoalmente, em colher os produtos da terra, não se entristeçam por isso, porque então são verdadeiros monges se vivem do trabalho de suas mãos, como também os nossos Pais e os Apóstolos. Tudo, porém, se faça comedidamente por causa dos fracos. De 14 de setembro até o início da Quaresma, entreguem-se à leitura até o fim da hora segunda, no fim da qual se celebre a Terça; e até a hora nona trabalhem todos nos afazeres que lhes forem designados. Dado o primeiro sinal da nona hora, deixem todos os seus respectivos trabalhos e preparem-se para quando tocar o sinal. Depois da refeição, entreguem-se às suas leituras ou aos salmos. Nos dias da Quaresma, porém, da manhã até o fim da hora terceira, entreguem-se às suas leituras, e até o fim da décima hora trabalhem no que lhes for designado.”

Após ter S. Bento determinado em sua Regra o conteúdo, o horário e o espírito do Opus primarium (a oração), a que o monge nada deve antepor, passa a tratar do trabalho corporal e espiritual, incluindo-o no esquema de sua ideia monástica universal. Introduzindo em seu código a obrigação do trabalho, S. Bento separa sensivelmente da tradição oriental o monaquismo romano. Não que os mosteiros orientais não consagrassem também ao trabalho a devida atenção — fizeram-no até em ampla escala — mas foi somente com S. Bento que o trabalho encontrou valor autônomo e verdadeira estima. Adaptando-o organicamente à vida comum monástica, S. Bento não só dotou sua obra de um elemento perdurável, mas beneficiou todo o ocidente com uma escola de fomento cultural mais intenso. O primeiro guia importante para o trabalho dos monges já havia sido composto por Agostinho, o grande mestre do mundo latino, na obra intitulada “De opere monachorunm”. Esse porém não foi além da doutrina. S. Bento foi quem a fez passar de teoria à prática, adaptando-a concretamente aos mosteiros ocidentais, pois a obra de Agostinho lhe era conhecida e foi por ele utilizada. Quanto ao modo, âmbito e tempo, tornou-se o opus secundarium uma das obrigações monásticas, um serviço igualmente divino, ao lado do Ofício Divino. “Ora et labora” exprime, em forma de provérbio, a ideia que S. Bento tinha do estado monástico.

Dom Ildefonso Herwegen, OSB, Sentido e Espírito da Regra de São Bento, pág. 284

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