Devocionário

Ora et Labora

22º Dia – Quarta-feira da 3ª Semana da Quaresma


O sétimo grau da humildade consiste em que o monge se diga inferior e mais vil que todos, não só com a boca, mas que também o creia no íntimo pulsar do coração, humilhando-se e dizendo com o Profeta: “Eu, porém, sou um verme e não um homem, a vergonha dos homens e a abjeção do povo: exaltei-me, mas, depois fui humilhado e confundido”. E ainda: “É bom para mim que me tenhais humilhado, para que aprenda os vossos mandamentos”.

É precisamente na realidade essencial do homem interior, que o sétimo grau põe todo o acento. Reconhecer-se menor e de menos valia diante dos outros é mais importante do que o reconhecimento das condições externas do estado de renúncia. Não se trata, pois, de renunciar somente aos próprios direitos, mas de renunciar a si mesmo”. E isso não há de ser apenas uma teoria, muito menos um mero modo de falar, mas uma convicção íntima que proclamamos com alegria de coração. A expressão “creia no íntimo pulsar do coração” tirou-a S. Bento “ipsis verbis” de Cassiano. Com o salmista deve o monge poder dizer: “Eu, porém, sou um verme e não um homem, o opróbrio dos homens e o desprezo da plebe” (Sl 21, 7); “exaltei-me e fui humilhado e confundido” (Sl 87, 16); e ainda: “é bom que me humilhastes para que eu aprenda os vossos mandamentos” (Sl 118, 71). Com isso a própria humilhação interior parece ter chegado ao limite extremo e, contudo, ainda assim, absolutamente não se afasta da verdade. Só Deus conhece o valor interior ou a falta de valor dum homem. Ainda que razões exteriores parecem afirmar o contrário, podemos continuar a crer que, em relação à disposição psíquica e ao ambiente, todos os outros são melhores do que nós. De nós mesmos sabemos, em todo caso, que falhamos de contínuo não obstante nos acharmos numa vida de abundantes graças. Se o homem tem sempre sido avesso a semelhante doutrina, de modo particular o é em nossos tempos. À humilhação de si mesmo é considerada incapacidade, fraqueza e covardia. A juventude é propensa à afirmação de si mesma até ao excesso da soberba, ainda não experimentou quanta energia interior, quanta penetração e madureza de juízo se exigem para configurar e realizar uma forma de vida à base da humildade cristã. Ignora, por conseguinte, que forças há para a comunidade depositadas: na sinceridade interior. É daqui que dimana a fonte da invencível capacidade cristã para o sacrifício. Note-se, porém, que S. Bento não cogita de modo algum do rebaixamento de si mesmo, o que nem sempre foi evitado pelos antigos monges. Para ele a humildade é até o fim, uma escola onde se aprende a observância dos preceitos divinos (“para que aprenda os vossos mandamentos”), Nossa vida moral ativa nunca se rebaixa, pois, a uma passividade de aviltamento de si mesmo. Para S. Bento, a humildade não consiste apenas em evitar o pecado, mas também, em impedir os excessos em coisas boas. Humildade segundo S. Bento é o que diz o vocábulo do alemão antigo: “dio-muoti”, coragem para servir.

Dom Ildefonso Herwegen, OSB, Sentido e Espírito da Regra de São Bento, pág. 136-137


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